RECORDANDO: O CÉU ESTRELADO DA MINHA INFÂNCIA…
É apenas mais uma noite quente de um sábado de
Verão. Estou na varanda, a ouvir música no meu Ipod (a modernidade tem destas
coisas maravilhosas) e balanço o corpo com o ritmo da melodia. Adoro perceber a
letra e vibro com cada som como se fosse eu o instrumento musical que lhe dá
aquele toque magistral. De repente, fixo o meu olhar no imenso céu e deixo-me
ficar quieta a observá-lo, quase como se estivesse a cortejá-lo. Porém, reparo
que ao seu lado está, muito atenta, a sua eterna companheira - a majestosa lua,
tal qual bela rainha no seu reino intocável. Sinto uma brisa agradável e
indescritível que me toca suave e delicadamente no rosto e se espalha
lentamente pelo meu corpo, apoderando-se dos meus movimentos e das minhas
emoções. No ar dança o perfume esquecido da pureza e da inocência… Inunda e
perturba a minha alma, uma súbita nostalgia da minha infância… A minha memória
recua até ao tempo em que tudo se resumia a uma sede insaciável de novidade,
divertimento e uma singela felicidade! O meu coração é invadido por uma imensa
saudade daqueles longos serões de Verão passados na varanda dos meus avós, nos
quais a companhia destes, das minhas tias, juntamente com a das minhas
companheiras de todas aquelas longas noites – as estrelas, tornava tudo
simplesmente, perfeito! Lembro-me clara e demoradamente desses momentos
deliciosos em que me sentava no chão quente da varanda, descalça, com os olhos
deitados no céu, ouvindo os grilos, quais afinados cantores… Lembro-me saudosa
e docemente do palpitar frenético do meu coração e da curiosidade espelhada no
meu olhar com aquele gozo inocente de contar as estrelas infinitas… As crianças
são de fato seres especiais porque acreditam na magia do impossível! Estou numa
espécie de hipnose e revejo aquele céu da aldeia em que as estrelas eram tantas
que iluminavam o meu brincar cheio de encantamento, mistério e doçura. Sim! Era
tal o brilho naquele céu que eu tinha dificuldade em dar um nome a todas as
minhas amigas celestiais. Afinal eram as minhas companheiras cintilantes e como
fieis amigas que eram, eu tinha de lhe dar um belo nome e, no mínimo, bastante
adequado as características de cada uma! Claro, porque o seu nome era sinónimo
do seu significado na minha curta existência de menina. O meu critério passava
por escolher primeiro o nome dos meus familiares, depois dos meus amigos, a
seguir dos colegas da turma, e quando se “terminava com as relações”,
inventava, pura e simplesmente. Finalmente subi as escadas da infância e
percebi que hoje, neste Sábado quente de Verão aparentemente tão normal me
esqueci de todos aqueles nomes. Esses mesmos nomes que, na minha imaginação
infantil fecunda de sonho e primavera me permitiam carinhosamente falar com as
minhas amigas estreladas. Todos, a exceção de um que eu adorava: a estrela
amiga POESIA! Era aquela a minha melhor amiga, a minha confidente, a minha
preciosa companheira. Estava lá todas as noites para conversar comigo…Para me
fazer voar com as suas palavras! Refleti sobre os motivos deste esquecimento e
não cheguei a nenhuma conclusão brilhante, apenas a um talvez. Não sei, agora,
talvez, lhe chame crescimento, desencantamento. Porque crescer traz consigo um
inimigo cruel – o frio e o vazio do triste esquecimento! Porém, este sábado
quente de Verão foi tudo menos um mero sábado… Sim! Este sábado foi o dia em
que reaprendi a contar as estrelas sem fim que povoam o quadro de uma infância
transbordante, mágica e feliz! Sim! Este sábado foi o dia em que voltei a ouvir
o canto do rouxinol! Sim! Este sábado foi o dia em que fiz as pazes com as
minhas amigas e companheiras estreladas! Sim! Este sábado foi o dia em que em
vez de um até sempre, as brindei com o mesmo sorriso encantado, o coração
renovado e com um até amanhã… Sim, este foi o sábado, do céu estrelado da minha
infância…!
Marta Limbado
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